A indústria mundial vivencia mais um momento de transição tecnológica marcada por um ritmo cada vez maior de inovação disruptivas[1].  Essa transição, conhecida como Indústria 4.0[2], começou a modificar a sua forma de produção e de competição.

A Indústria 4.0 é uma confluência e fusões de tecnologias disruptivas. Muitas delas já estão consolidadas no mercado, mas foram aprimoradas e combinas, formando clusters, provocando um movimento de mudança na trajetória tecnológica. A CNI e o IEL apontaram oitos principais clusters tecnológicos que estão e continuarão impactando os produtos, os processos, a gestão e os modelos de negócio da indústria mundial (e não apenas limitado a este setor):

Figura 1 – Clusters Tecnológicos:

Fonte e Elaboração: Projeto Indústria 2027 (CNI E IEL, 2017).

 

A aplicação das tecnologias 4.0 no processo industrial criam as chamadas Fábricas Inteligentes.  A produção dessas fábricas passa a ser controlada por sensores, software e equipamentos conectados que permitem coletar e analisar grandes volumes de dados (big data), criando processos mais rápidos e eficientes, para produzir produtos de maior qualidade a custos reduzidos. Nestas fábricas ocorre a união do mundo físico ao virtual, que será intensificado com o 5g, integrando todas as etapas do processo de produção e alterando a forma de criação de valor. As máquinas conversam com outras máquinas (M2M) e com os insumos ao longo da cadeia de produção automatizada, flexível e com auto-organização (IEDI, 2017).

Nas fábricas inteligentes há uma descentralização dos processos decisórios, pois os sistemas cyber-físicos permitem que a decisão seja baseada nos dados coletados e armazenados em nuvem durante a produção (em tempo real), sem precisar de ação externa. Esses sistemas possuem funções de alta complexidade e previsibilidade, permitindo maior transparência e sustentabilidade na produção. Os produtos podem ser pré-visualizados por meio de simulações computacionais e produzidos por impressoras 3D.

Esses avanços tecnológicos vão muito além dos sistemas e máquinas com inteligência artificial e conectadas em rede (IOT). Seu escopo abrange inovações em áreas que vão desde o sequenciamento genético até a nanotecnologia, biotecnologia, energias renováveis e a computação quântica. Ou seja, é uma fusão de tecnologias entre os domínios físicos, digitais e biológicos que mudam a forma da produção industrial (SCHWAH, 2016).

Como resultado haverá o aumento na produtividade, o encurtamento dos prazos de lançamentos de novos produtos no mercado, a eficiência no uso dos recursos, a flexibilidade das linhas de produção e o aumento da customização (CNI E IEL, 2017). A Consultoria Mckinsey estima que em 2025 haja redução dos custos de equipamentos variando entre 10% e 40%; diminuição do consumo de energia em 10%; e aumento da eficiência do trabalho entre 10% e 25%.

Devido as tecnologias 4.0, a indústria mundial começou a entrar em um novo modelo de produção que modifica a forma de concorrência no mundo.  Esse modelo não é futurista, é uma realidade atual, apesar de não completamente difundida, que está em construção desde meados de 2010. A aplicação desse novo modelo produtivo permite que as empresas construam vantagens competitivas dinâmicas[3] propiciando a manutenção e a conquista de posições sustentáveis no mercado. E, no caso inverso, a não adaptação a essa nova forma de produzir colocará em cheque a sobrevivência da empresa.

Ou seja, para a indústria brasileira, incluindo a capixaba, se manter competitiva é crucial que ela consiga, pelo menos, acompanhar e adotar essas tecnológicas 4.0. Mas, a adoção por essa indústria do modelo de produção da manufatura avançada precisa ser completa pois, como diz Denis Balaguer, “nenhuma empresa sobreviveu muito tempo com lâmpadas elétricas iluminando um galpão de produção repleto de máquinas a vapor”.

O tempo de impacto dessas tecnologias sobre a indústria é moldado de acordo com a especificidade da estrutura industrial, de mercado e tamanho da empresa. Por exemplo, as empresas de TIC tendem a se adaptar mais rapidamente do que as indústrias mais intensivas em mão de obra. Em relação ao porte, a adequação tecnológica das micro e pequenas empresas serão mais demoradas e complicadas do que as das médias e grandes.

Essa variação na capacidade de adaptação das empresas pode ser explicada, entre outros fatores, pela alta complexidade das tecnologias 4.0, pelas diferenças de competências tecnológicas entre as firmas, pelo nível de conhecimento dos funcionários e pela disponibilidade de financiamento para investimento em novas tecnologias e em treinamento técnico dos empregados. No entanto, independentemente da especificidade da indústria, o impacto desse ritmo de transformação global da indústria será sentido por todas.

É por isso que iniciativas que auxiliam a indústria a se adaptar às mudanças em curso são tão fundamentais para o setor. A Alemanha, os Estados Unidos e a China são muito ativos nesse quesito. Na verdade, foi o modelo de política industrial e tecnológica adotado em meados de 2010 pela Alemanha e, o praticado pelos EUA a partir de 2012 que fizeram emergir o que, atualmente, compreende-se como indústria 4.0 ou manufatura avançada. A China se inseriu nesse processo mais recente, mas já se tornou um lócus dessas tecnologias, principalmente no cluster de armazenamento de energia.

O Brasil ainda está muito tímido em relação a indústria 4.0. A discursão interna sobre o tema “ganhou mais corpo” em 2016, transbordando para o Ministério da Ciência, Tecnologias e Inovação (MCTI) a partir de 2017. Com isso, iniciativas voltadas a indústria 4.0 e a automação industrial começaram a ser implementadas no país. Por exemplo, a CNI e o IEL, com execução técnica da UFRJ e Unicamp, realizaram o Projeto Indústria 2027 que avalia de que modo os novos clusters tecnológicos vão influenciar a indústria nos próximos anos. Já o MCTIC e Ministério da Economia lançaram uma iniciativa chamada “Câmara Brasileira da Indústria 4.0”.

No Espírito Santo também há importantes inciativas que entre elas podemos citar:

  • Projeto Indústria + Avançada do Senai-ES e Sebrae-ES: auxilia as micro e pequenas empresas capixabas a evoluírem no patamar da manufatura avançada;
  • Programa Indústria 4.0 do Bandes: disponibiliza soluções de crédito destinados à investimentos em modernização e melhoria na produção e em tecnologias emergentes de TI e automação industrial.
  • Plano Estratégico Indústria 2035 da Findes, sob coordenação do Ideies: esse plano, entre outras atribuições, faz um mapeamento das tendências e tecnologias-chave para a manutenção da competitividade dos Setores Portadores de Futuro para o Estado do Espírito Santo. Neste plano, na etapa da Rota Estratégica para o Futuro da Indústria do Espírito Santo, também são elaboradas ações (curto, médio e longo prazo) visando o acompanhamento dessas tendências e tecnologias identificadas.
  • Findeslab: caracterizado como hub de inovação no estado, essa iniciativa promove a conexão entre os desafios gerados nas empresas locais com as propostas de ideias e soluções, com destaque para as de base tecnológica, de empreendedores (à exemplo robotização de atividades industriais, IOT, automação do processo de vendas, entre outras).

Apesar disso, ainda estamos muito distantes da nova fronteira de desenvolvimento tecnológico mundial. Para isso, precisamos pensar a melhor maneira de, no mínimo, acompanhá-la. E, muito mais importante, precisamos nos questionar qual será o nosso papel nessa fronteira: vamos manter a atual postura passiva, como absorvedores de tecnologias? Ou será que queremos aproveitar a “janela de oportunidade” aberta pela indústria 4.0 e começarmos a construir essa fronteira tecnológica? Até para responder as essas questões o Brasil está atrasado.

 

REFERÊNCIA:

CONFEDERAÇÃO NACIONAL DA INDÚSTRIA (CNI); INSTITUTO EUVALDO LODI (IEL). Desafios para Indústria 4.0 no Brasil. Brasília, 2016.

_____. Mapa de Clusters Tecnológicos e Tecnologias Relevantes para a competitividade de Sistemas Produtivos: Riscos e Oportunidade para o Brasil diante das inovações disruptivas. Brasília, 2017.

DINIZ, C. C.; SANTOS, F.; CROCCO, M. Conhecimento, inovação e desenvolvimento regional/local. In: DINIZ, C. C.; CROCCO, F. (org). Economia Regional e Urbana: Contribuições teóricas recentes. Editora UFMG, 2006.

IEDI. Indústria 4.0: a quarta revolução industrial e os desafios para a indústria e para o desenvolvimento brasileiro. IEDI, São Paulo. 2017.

SCHWAB, K. A Quarta Revolução Industrial. ed. Edipro. 2017.

 

[1] Inovação consiste na aplicação bem-sucedida de um novo produto, processo, serviços e matéria prima ao mercado. Ela pode ser classificada como incremental (aprimoramento de uma inovação já consolidada no mercado), radical (criando algo completamente novo) e disruptivas (inovações que transformam ou criam modelos de negócios e mercados).

[2] A “Indústria 4.0”, “intelegent factory”, “smart factory” ou “factory of the future” são os nomes que descrevem a transformação na produção industrial provocadas pelas ditas tecnologias.

[3] Vantagens competitivas são atributos diferenciados de uma empresa que a permitem usufruir de significativas vantagens de competição sobre os concorrentes. Esses atributos podem ser adquiridos por meio de acesso a recursos naturais, a mão de obra mais barata, localização geográfica, as novas tecnologias e etc. Uma vantagem competitiva é dinâmica (ou de capacidades dinâmicas) quando uma empresa possui a capacidade de adaptar, integrar e reconfigurar seus recursos internos e externos para atender os requisitos de um ambiente em constante transformação ditado pelo ritmo das inovações, como é o caso da indústria 4.0.  Neste aspecto, a competitividade está relacionada com a capacidade dessa empresa em construir e readaptar as suas competências internas e externas em um ambiente de rápida mudança provocado pelas inovações. Para isso ocorrer, é necessário que a empresa acumule e sempre adquira conhecimentos organizacionais, tecnológicos e inovativos. Para maiores detalhes vide Diniz et. al (2006).

 

Thais Mozer é economista, mestre pela UFES e analista do IDEIES.

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